Artigo - 24/10/2025 | Escrito por Antonio Carlos Prado

A lição da morte de Vladimir Herzog

Completa-se neste sábado, 25 de outubro de 2025, meio-século do assassinato do jornalista Vladimir Herzog, à época diretor de jornalismo da TV Cultura, após trabalhar na BBC, em Londres.


Uma das principais decorrências de sua morte foi, na América Latina, a união de líderes de diversas religiões que, de forma pacífica, aceleraram a derrocada de autocratas. E não foi diferente no Brasil.


Na atual conjuntura política mundial, onde vemos crescerem a intolerância, a violência, a tortura e o radicalismo político, com certeza uma grande solução seria, igualmente, a criação de um movimento global de religiosos na formação e manutenção de regimes garantidores do Estado de Direito.


Viajemos de volta ao passado. Herzog foi morto sob tortura, também em um sábado e exatamente há cinco décadas, nas dependências do DOI-Codi de São Paulo, um dos porões da ditadura --- em 1964 ela se instaurou no Brasil, apeando do poder o presidente João Goulart. O regime de exceção se alongou até 1985. Herzog morreu em decorrência de choque elétrico, pancadas no pau-de-arara e sessões de afogamento. Estava com 38 anos e contribuía para o jornal do Partido Comunista Brasileiro.


Pouco dias após o seu assassinato - que os algozes tentaram disfarçar em  suicídio - um monumental ato ecumênico realizou-se na catedral da Sé e na praça em que ela se localiza, por iniciativa de dom Paulo Evaristo Arns, então arcebispo de São Paulo, do rabino Henry Sobel e do pastor James Wright. Estimativas do próprio governo deram conta da presença de aproximadamente dez mil pessoas.


Começava aí uma nova etapa da abertura política no Brasil, desejada pelo ex-presidente general Ernesto Geisel: em janeiro de 1976, circunstâncias idênticas causaram a morte do metalúrgico Manuel Fiel Filho. Geisel exonerou   imediatamente o comandante do II Exército.


Eis uma lição que a sevícia e morte de Herzog deixam ao mundo: a união e participação de religiosos são de vital importância, e muitas vezes mais eficazes que armas na defesa dos Direitos Humanos e do Estado Democrático de Direito.


O caso Herzog ensejou a primeira condenação da União pela morte de um preso político. Representando a viúva Clarice Herzog, os advogados Samuel Macdowell de Figueiredo e Marco Antônio Rodrigues entraram na Justiça pleiteando indenização. Estrategicamente não usaram nenhuma vez a palavra tortura. Argumentaram apenas que Herzog estava em um local sob a guarda do Estado. Entrou vivo e de lá saiu morto. O Estado é responsável pela incolumidade física e mental de quem ele prende. O juiz Márcio José de Moraes acatou a tese e a União saiu condenada. 

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